sexta-feira, 1 de maio de 2015

As muitas mortes de Al Baghdadi.

Al Baghdadi foi dado como criticamente ferido pela terceira
vez. A pergunta é: Importa? Foto de divulgação.

A campanha contra os extremistas do Estado Islâmico parece ter tido um sucesso: segundo o The Guardian, o líder e auto-proclamado Califa do grupo terrorista, Abu Bakr al-Baghdadi, foi gravemente ferido em um ataque aéreo no final de março. Seriam ótimas notícias para a campanha contra o EI... não fosse pelo fato da notícia levantar dúvidas: em novembro passado, al-Baghdadi também havia “sido ferido gravemente em um ataque aéreo”, notícia que se revelou falsa. E o mesmo ocorrera em julho do ano passado.

A incerteza dessas informações é sinal da precariedade tanto da inteligência aliada na região, quanto da cobertura jornalística. O estado de caos na Síria e no Iraque é tamanho que coletar informações confiáveis se torna cada vez mais difícil, dependendo de fontes anônimas e “citizen journalists” que nem sempre tem compromisso com a verdade. E nesse caos, informações se perdem, se inventam e o que é noticiado nem sempre condiz com a realidade.

Há um perigo muito grande em se contar com a vitória nesse momento. Se o estado de al-Baghdadi for uma mentira isso é mais munição para os extremistas, que poderão novamente dizer que “o ocidente” mente para os árabes. E se for verdade? A morte de al-Baghdadi pode não ser uma vitória: vivo, o auto-proclamado califa é um líder. Morto, é um mártir com uma influência ainda maior e um vácuo de poder a ser preenchido.

Sim, a possível morte de al-Baghdadi pode esfacelar o Isis, caso seus asseclas virem uns contra os outros buscando tomar o poder para si. Isso pode ser bom para o ocidente (afinal, a ameaça do EI se fragmenta), mas não é nada bom para o Oriente Médio. Uma disputa pelo poder nesse momento significaria uma guerra civil ainda mais violenta no Iraque e na Síria, que já sofrem com o caos generalizado.

Ao mesmo tempo, a morte de al-Baghdadi pode aumentar a sua influência a níveis sem precedentes. Como muitos movimentos extremistas de fundação abraâmica, o EI tem uma obsessão com o conceito de martírio, e não poderia haver mártir melhor que um “homem santo assassinado covardemente pelos infiéis, que visavam silenciar sua palavra”.

A situação do Estado Islâmico é um legítimo Ardil 22, como no clássico romance de Joseph Heller: a permanência de al-Baghdadi no poder é uma ameaça, pois é aquilo que sustenta o EI; a solução para esse problema seria retirá-lo do poder. No entanto, matar ou fazer uma “rendição extraordinária” faria dele um mártir, o que aumentaria o poder e a influência do EI. Resolver a situação de forma pacífica é inviável enquanto o grupo mantiver controle militar da região, e dialogar com a população é impossível sem retirá-los de lá. Bombardeá-los até a submissão é impossível, dado que seus mortos se tornam motivação para novos militantes e as tentativas de fulminá-los causam mais baixas civis do que de extremistas. As condições do dilema tornam qualquer solução inviável.

E ao contrário do cenário proposto pelo filme “Jogos de Guerra”, de 1983, este é um jogo em que não existe a opção de não jogar. É fácil pensar em um conflito armado como uma partida de Xadrez: elimina-se o rei, e o jogo está ganho. Bem, este rei foi aparentemente eliminado três vezes. E o jogo continua. Al-Baghdadi, o homem, não é importante, como notou o professor de história da California State University, Ibrahim Al-Marashi. Seu carisma formou o ISIS, e o impeliu a se tornar o Estado Islâmico.

Quando a atual “guerra ao terror” se iniciou, o grande inimigo era a Al-Qaeda, liderada por Osama bin Laden. No fracasso da Al Qaeda, o EI cumpriu aquilo que Osama prometera: um califado islâmico no século XXI. Seus seguidores não se sustentam mais na nostalgia do califado Abássida, uma memória idealizada de sete séculos atrás, mas em preservar o seu califado. O seu “estado ideal”. E isso é muito mais difícil de sufocar do que as palavras de um homem só. Se al-Baghdadid morrer, vira mártir e herói. Se viver, continua como líder. De qualquer maneira, todos perdem, menos os extremistas.

Há de haver uma solução. Esperemos que a comunidade internacional saiba como encontrá-la. Ao final da segunda guerra mundial, a solução para evitar a retomada do Nazismo e do Imperialismo Japonês foi a reconstrução dos dois países, com fortes políticas para combater o extremismo. Mas antes que essas medidas fossem implementadas, foi necessária uma grande perda de vidas para derrotar às maquinas de guerra da Alemanha e do Japão.